Durante quase três décadas, a E3 foi o principal palco da indústria dos games. Era ali que a Nintendo, a Sony, a Microsoft e uma fila interminável de estúdios e publishers exibiam, com “pompa”, os jogos que definiriam anos inteiros do mercado. Com conferências ao vivo, trailers explosivos e estandes multimilionários em Los Angeles, o evento se transformou gradualmente em sinônimo de anúncio bombástico e “guerra de consoles”. Mas a pandemia acelerou uma crise que já vinha se desenhando, e em 2023, a E3 foi oficialmente cancelada de forma definitiva. O mundo dos jogos, no entanto, não ficou sem vitrine. Em seu lugar, surgiu um nome que parecia temporário, a Summer Game Fest.

A E3 (sigla de Electronic Entertainment Expo) nasceu em 1995, e era organizada pela ESA, a Entertainment Software Association, entidade que representa os interesses das grandes empresas de games nos Estados Unidos. A ideia era dar aos videogames um evento próprio, longe da CES, que até então servia de vitrine improvisada pro setor. E a ideia funcionou muito. Ainda nos anos 90, a E3 já foi palco para o primeiro PlayStation, para o anúncio do Nintendo 64, e para as tentativas desesperadas da Sega com o Saturn e o belíssimo Dreamcast.
Anuncio do PlayStation durante a E3 de 1995
Nos anos 2000, a feira virou uma espécie de ritual anual. Foi onde o mundo viu, pela primeira vez, trailers de Halo 2, Metal Gear Solid 2, Zelda: Twilight Princess, Resident Evil 5, Final Fantasy XIII e God of War III. Em 2015, a plateia quase desabou quando a Square Enix mostrou o remake de Final Fantasy VII (eu chorei assistindo o trailer, acredite). Em 2019, Keanu Reeves virou meme eterno com o “You’re breathtaking!” no palco da Microsoft.

Mas a toda essa estrutura começou a desandar em silêncio. Em 2013, a Nintendo foi a primeira gigante a deixar o palco ao vivo e trocar sua apresentação por vídeos gravados, os famosos Directs. Em 2019, a Sony fez o mesmo. A E3 começava então a parecer velha demais, tinha se tornado um evento caro, centrado na imprensa e com modelo de negócios travado. Os custos para exibir jogos ali eram altíssimos, e os resultados, cada vez menos garantidos. A indústria estava migrando pro digital, pro marketing direto e pro YouTube. E a E3 ainda insistia em cobrar milhões por um espaço físico em Los Angeles.
A pandemia foi o “fatality”. Em 2020, o evento foi cancelado. Em 2021, tentaram uma versão digital, fraca, sem força. Em 2022, suspenderam tudo de novo, por conta da variante Ômicron da COVID-19. E em 2023, mesmo com a promessa de uma edição presencial, tudo desabou. A Ubisoft, que inicialmente apoiaria o evento, desistiu. Sony, Microsoft e Nintendo já tinham pulado fora. Faltando poucos meses pro evento, ficou claro que a E3 não ia acontecer. E não aconteceu. Em dezembro, a ESA anunciou que a E3 estava oficialmente morta.
Enquanto a ESA se enrolava, Geoff Keighley já tinha começado a preencher o espaço. Em 2020, ele criou a Summer Game Fest. A proposta do evento era fazer o que a E3 fazia, mas direto com o público, com eventos digitais espalhados ao longo de semanas. Sem estande, sem plateia e sem intermediário. A primeira edição foi tímida, mas trouxe anúncios como Unreal Engine 5, Crash Bandicoot 4 e Cuphead no PS4. A crítica achou o formato disperso, mas a base do futuro estava ali.
Nos anos seguintes, a SGF passou a acontecer em junho, exatamente no lugar que a E3 deixava vazio. Em 2023, ganhou um formato híbrido, com transmissão global e evento físico limitado em Los Angeles, o “Play Days”, com sessões presenciais para a imprensa e influenciadores.

Summer Game Fest 2025
Em 2025, a Summer Game Fest chegou à sua sexta edição com mais de 60 parceiros, incluindo Xbox, PlayStation, Square Enix, Ubisoft, Capcom, SEGA e até a Nintendo, que por muito tempo manteve distância. O evento principal, transmitido do YouTube Theater, trouxe jogos como Death Stranding 2: On The Beach, Resident Evil Requiem, Atomic Heart 2, Sonic Racing CrossWorlds e Onimusha: Way of the Sword. Tudo isso acompanhado de trailers com datas, demos surpresa, shadowdrops e jogos de todos os tamanhos.
Nos dias seguintes, os criadores de conteúdo e a imprensa tiveram acesso ao Play Days, onde puderam testar dezenas de jogos inéditos num ambiente controlado e sem o caos das feiras de antigamente. O modelo funciona. É mais barato pros estúdios, mais viável no pós-pandemia, e mais transparente pra quem cobre o setor.

Summer Game Fest 2025 – Play Days
A E3 era espetáculo. Era fila, barulho, gritaria, papel picado e brinde de estande. Também era exclusão de público, de desenvolvedores menores e de qualquer um que não tivesse uma credencial nas mãos. A Summer Game Fest é o oposto. Ela não tenta recriar o clima da E3. Ela fala com a câmera, com o trailer, com o celular na mão do jogador. É outro tipo de evento, e talvez por isso esteja dando certo.
Claro que não ela não é perfeita. Existem críticas válidas ao ritmo, à falta de grandes surpresas, e ao espaço limitado pra estúdios independentes. E nem sempre a SGF tem o impacto que a E3 teve no seu auge. Mas é um formato atual. E acima de tudo, é o que funciona hoje.
A ESA tentou manter uma tradição que não acompanhava mais o mercado. Geoff Keighley entendeu que o público mudou, e agiu. Ponto pra ele.